Ele foi um dos personagens da última edição da Revista Vox, publicação do Grupo IMPACTO que traz histórias, iniciativas e pessoas transformadoras.
E uma destas mobilizações – em que o design Fabiano Burgos Balbino faz parte – é um projeto que reúne artistas e produtores da Alta Paulista, com objetivo de valorizar as texturas, cores, aromas e sabores da nossa região.
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Com 35 anos, o adamantinense é exemplo de transformação, da arte, já que utiliza troncos e raízes para fabricação de móveis, e da vida, pois deixou a dependência química para se dedicar ao seu talento, um “dom de Deus”, conforme relata.
Na entrevista ao IMPACTO, o design conta sua trajetória até os dias atuais, reconhecida nos trabalhos que trazem uma nova perspectiva sobre a natureza.
Quem é Fabiano Burgos Balbino?
Uma pergunta que me parece uma incógnita, para mim mesmo! Mas, vamos lá… Sou uma cara fácil de lidar, de certa maneira, e ao mesmo tempo muito difícil em alguns assuntos. Gosto de observar as criações de Deus e, principalmente, a fauna e a flora: meus preferidos, pela grande variedade de espécies. Todos os dias reservo um tempo para ouvir o cantar dos pássaros, ver as os detalhes das flores, das árvores, e todo tipo de seres diferentes que existe na nossa fauna. O melhor de observar é que eles, com o pouco que ainda tem, se adaptam e sobrevivem.
Outra obra de Deus que gosto de observar é o ser humano, e se tornou uma forma de tentar entender eu mesmo e ser grato ao que tenho e como sou hoje.
Mas,a verdade, gosto de observar e tirar as melhores lições possíveis. Como digo, sou um absorvedor de detalhes,e o que isso significa: o que for bom para minha vida, eu levo a tentar praticar! E aquilo que não for eu já abandono e bola pra frente, não gosto de carregar cargas negativas das pessoas.
Porém, como todo ser humano tem uma história, e a minha – como alguns amigos dizem – daria um livro. Eu já fiz de tudo um pouco e tive muitas experiências, boas e ruins.
Minha aptidão pelas artes plásticas e todo tipo de artesanato, desde muito jovem, tive incentivo de várias pessoas e professores por verem que tinha facilidade com desenho e as artes manuais, e fui me aperfeiçoado.
Tive muitos problemas com as drogas, cocaína e álcool,quando começou meu afastamento de tudo que gostava e amava. Perdi tudo por causa deste caminho que trilhei por 19 anos. Fui internado várias vezes, até fora do estado, para tratamento de desintoxicação, mas sempre fugia e voltava para drogas até que um dia fui preso por assalto, onde fiquei 758 dias. Sim, eu contei cada dia naquele lugar, e prometi que para lá não voltava.
O tempo passou e fui parar novamente nas drogas, e ainda pior: com uma depressão, e a necessidade de tomar muitos remédios controlados,aliada ao uso de entorpecentes culminou em uma sequência de tentativas de suicídio, 11 no total, mas Deus ainda não queria que eu saísse da terra.
Começaram as internações no hospital psiquiátrico, pois já estava sendo tratado com psicótico e drogadista. Foram várias as internações até que fui internado por medida judicial e fiquei 10 meses.
Neste tempo, fiquei três meses separado dos demais pacientes, não podia sair de dentro da ala destina ao tratamento, e foi neste local onde encontrei minha paz.
Perambulava dentro desta ala o dia todo e a noite também. Dormia de duas a três horas por noite, e isso durava muitos anos (12 anos para ser exatos), só conseguia dormir por este tempo restrito com grandes cargas de remédios prescritas pelo médico, eram aproximadamente 24 comprimidos psicotrópicos.
Certo dia, andando na ala, me deparei com uma enfermaria e vi uma bíblia dentro deste local. Pedi para ler. Conhecia Jesus, de ouvir falar, mesmo não indo à igreja. A partir deste dia, levei esta bíblia para o quarto e comecei a ler e orar pedindo para que Deus me mostrasse o caminho.
Tentar descrever isso é até surreal para muitos, mas desde aquele dia comecei a dormir como qualquer pessoa, com a ajuda de Deus e do já falecido Miguel Boiça [médico]. Ele foi reduzindo a carga de remédio até chegar a apenas um comprimido.
Quando pude ir para a área de terapia ocupacional surgiu a oportunidade de pegar em um lápis novamente, ver a arte através das minhas mãos, e ali teve um dia que iam fazer uma limpeza de materiais velhos e pedi umas tintas e uma tela que iam ser jogados. Comecei a pintar meus quadros, foi ali que Deus aflorou novamente meu Dom.
Logo, no completar dos 10 meses, tive alta do hospital e voltei para casa. Não foi fácil percorrer o caminho até minha casa e tentar mudar 19 anos de dor e sofrimento que causei para minha família.
Logo na primeira chance prestei vestibular na faculdade com a ajuda da minha mãe, Maria Consuelo Burgos, que ajudou a custear todo estudo até minha formação.
Hoje sou formado pela UniFAI [Centro Universitário de Adamantina] em Design, tenho meu próprio negócio, um ateliê chamado Burgos Artes Design, onde construo móveis com troncos e raízes de madeira proveniente de árvores já caídas ou descartadas, damos vida nova aquilo que viraria carvão.
Observar ao invés de só olhar nos dá novos horizontes, até mesmo em um trabalho.
Que tipo de trabalho realiza? Desde quando transforma troncos em peças de decoração?
Trabalho com construção de móveis proveniente do uso sustentável da madeira. No segmento que escolhi para trabalhar vai fazer cinco anos que estou atuando. Foi um ano pesquisando muito e testando estilos, e outros quatro já comercializando e vivendo somente deste trabalho.
Quando surgiu a inspiração para realizar este tipo de trabalho? Tem algum incentivador?
Nestas minhas observâncias da vida notei que na cidade de Adamantina se retirava muita madeira, principalmente da espécie Oiti, quem tem para todo lado. Fiquei me questionando o que se fazia com a madeira, eu fui investigar.
Percebi que a maior parte é transformada em lenha ou era descartada no aterro da cidade. Fiz algumas pesquisas e notei que existia um mercado para este segmento, muito seleto, e busquei informações das ferramentas utilizadas para o tratamento e fui atrás, trabalhei em dobro para conseguir.
Como havia trabalhado com motosserra no passado, já tinha um passo enorme para dar certo, e só precisaria me adaptar para agora construir móveis, que não é a mesma coisa que cortar um galho ou tronco. Os cortes são feitos no local da retirada da madeira e, sendo assim,precisam ser precisos para não perder as peças.
Sobre quem me incentivou jamais posso esquecer a minha mãe, que sempre esteve disposta ajudar em minha ideias malucas, como ela mesmo dizia, e ao professor Sergio Genaro, pois me incentivava a correr atrás e sempre dizia que“se precisar de uma ajuda era só chamar”. Ele até deixou usar sua chácara para guardar algumas peças e trabalhar. E também a minha esposa, “galo de briga”, Juliana Sensiareli. Como todo sonhador tem seus altos e baixos, e ela sempre esteve do meu lado.
Realiza algum outro tipo de artesanato?
Graças a Deus tenho facilidade com todo tipo de trabalhos manuais, meus favoritos são pintura em óleo sobre tela, entalhe em madeira, escultura, restauração de móveise, agora, escultura abstratas com madeira e escultura de madeira feita no torno.
Quais materiais utilizam em suas peças?
Construo móveis com troncos e raízes de madeira proveniente de árvores já caídas pela ação do tempo ou descartadas. Damos vida naquilo que a maioria não vê nada, a não ser lixo!
E, principalmente, faço o que gosto. Eu acrescento ao invés de destruir.
Onde pode ser encontrado o seu trabalho?
Meu trabalho é divulgado nas redes sociais e no boca a boca mesmo, pois o espaço é pequeno, assim trabalho somente com encomendas.
Tenho algumas peças a pronta entrega, no Sincomercio Nova Alta Paulista [Sindicato Patronal do Comércio Varejista], na loja do Empório Flamejante.
Nas redes sociais,Facebook e Instagram, procure pelo endereço Burgos Artes Design, páginas que têm centenas de fotos de trabalhos construídos no ateliê, em Adamantina, e que estão espalhados pelos quatro cantos do Brasil.
O que pretende mostrar com sua arte?
Devemos observar as coisas a nossa volta de uma forma diferente, com uma semiótica bem extensa, saber que tudo que fazemos hoje traz consequências amanhã.
Se você tem uma árvore em sua casa e quer retirar porque suja, pense que você não pode reclamar do calor e terá que gastar com ar condicionado ou adquirir mais ventiladores. O assunto a se destacar é preserve o pouco de verde que ainda temos e repense antes de tomar alguma atitude neste quesito.
Agradeço a Deus e minha família, esposa, amigos e clientes, saber que é um breve resumo de minha história e trajetória ao qual me envergonho de algumas coisas do passado, mas conto para todos, pois são verdades na minha vida as quais me fizeram fortes para estar vivo hoje e dizer que nunca deixei de agradecer e buscar a Deus, que resumiu em alegria.