A divulgação de estudo que aponta a presença de 27 agrotóxicos na água de Adamantina trouxe alarde na população na última semana. Porém, a contaminação foi negada pela Sabesp – companhia responsável pelo abastecimento na cidade.
Profissionais da área regulatória de produtos fitossanitários, sementes e insumos também se posicionaram sobre o fato na terça-feira (23): “informações são manipuladas”.
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Com diversas versões, o vereador Acácio Rocha (DEM) informou ao IMPACTO que se mobiliza e apresentará requerimentos na próxima sessão ordinária da Câmara Municipal, junto com os demais parlamentares, visando esclarecimentos sobre os testes realizados na água do sistema de abastecimento da cidade.
ESTUDO APONTA ÁGUA CONTAMINADA
Uma perigosa mistura de 27 agrotóxicos foi detectada na água de 1.396 municípios brasileiros nos anos de 2014 a 2017, entre eles Adamantina. Neste período, a contaminação subiu de 75% dos testes para 92% em todo o país, aponta a pesquisa divulgada no último dia 15.
Apesar de serem disponibilizados pelo Ministério da Saúde, os dados foram obtidos e tratados em investigação conjunta da Repórter Brasil, Agência Pública e a organização suíça Public Eye. As informações são parte do Sisagua (Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano), que reúne os resultados de testes feitos pelas empresas de abastecimento.
“A situação é extremamente preocupante e certamente configura riscos e impactos à saúde da população”, afirma a toxicologista e médica do trabalho Virginia Dapper.
Entre os agrotóxicos encontrados em mais de 80% dos testes, há cinco classificados como “prováveis cancerígenos” pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos e seis apontados pela União Europeia como causadores de disfunções endócrinas, o que gera diversos problemas à saúde, como a puberdade precoce. Do total de 27 pesticidas na água dos brasileiros, 21 estão proibidos na União Europeia devido aos riscos que oferecem à saúde e ao meio ambiente.
RISCO DAS PEQUENAS QUANTIDADES
Mesmo quando se olha a contaminação de cada agrotóxico isoladamente, o quadro preocupa, diz o levantamento. Dos 27 agrotóxicos monitorados, 20 são listados como altamente perigosos pela Pesticide Action Network, grupo que reúne centenas de organizações não governamentais que trabalham para monitorar os efeitos dos agrotóxicos.
Mas, aos olhos da lei brasileira, o problema é pequeno. Apenas 0,3% de todos os casos detectados de 2014 a 2017 ultrapassaram o nível considerado seguro para cada substância. Mesmo considerando os casos em que se monitora 10 agrotóxicos proibidos no Brasil, são poucas as situações em que a presença deles na água soa o alarme.
E esse é o segundo alerta feito por parte dos pesquisadores: os limites individuais seriam permissivos. “Essa legislação está há mais de 10 anos sem revisão, é muito atraso do ponto de vista científico” afirma a química Cassiana Montagner. “É como usar uma TV antiga, pequena e preto e branco, quando você pode ter acesso a uma HD de alta definição”.
Ela se refere a pesquisas mais recentes sobre os riscos do consumo frequente e em quantidades menores, um tipo de contaminação que não gera reações imediatas. “Talvez certo agrotóxico na água não leve 15% da cidade para o hospital no mesmo dia. Mas o consumo contínuo gera efeitos crônicos ainda mais graves, como câncer, problemas na tireoide, hormonal ou neurológico”, alerta Montagner. “Já temos evidências científicas, mas a água contaminada continua sendo considerada como potável porque não se olha as quantidades menores”, afirma.
SABESP NEGA CONTAMINAÇÃO
Responsável pelo abastecimento de Adamantina, a Sabesp negou a contaminação da água em nota enviada ao IMPACTO. Segundo a estatal, os níveis de agrotóxicos encontrados na água são residuais e estão previstos na lei brasileira, que segue o padrão da OMS (Organização Mundial de Saúde). “Em Adamantina, não foi encontrado nenhum agrotóxico acima dos limites brasileiros”, enfatiza.
A nota traz ainda entrevista com uma professora da Unicamp a rádio CBN, a química Cassiana Montagner, que também é citada no estudo do site Por Trás dos Alimentos.
“Na entrevista, a professora da Unicamp diz que as concentrações encontradas não são alarmantes, que são concentrações muito baixas, residuais, que são reflexo do que é encontrado nos nossos mananciais. Por isso, é importante cuidarmos dos mananciais, para evitar a contaminação por agrotóxicos. Diz ela: “O uso intensivo de agrotóxicos no nosso dia a dia reflete na água, vai estar presente em quantidades muito, muito pequenas”. Diz também que o Brasil segue os parâmetros internacionais, definidos pela Organização Mundial de Saúde”, destaca a nota da Sabesp
A Companhia garante “a segurança do abastecimento da população, por meio de testes diários realizados em laboratórios certificados pelos órgãos competentes”. “Sempre que necessário, para segurança da população, os testes são refeitos”, informa a Sabesp, que completa: “são realizados 90 tipos de testes e mais de 90 mil análises mensais que aferem turbidez, cor, cloro, coliformes totais, metais, agrotóxicos, dentre outros”.
A estatual finaliza dizendo que “os relatórios de qualidade da água são enviados mensalmente ao Ministério da Saúde e também são disponibilizados às Vigilâncias Sanitárias dos municípios”. “Além disso, os clientes podem conhecer esses resultados na conta de água ou pelo site da Sabesp (www.sabesp.com.br)”.
DADOS “MANIPULADOS”
Em nota divulgada nesta semana, o Portal Ciência e Tecnologia Agro (C&T Agro), iniciativa de profissionais da área regulatória de produtos fitossanitários, sementes e insumos, pontuou que o levantamento disponível pelo site Por Trás dos Alimentos contém informações “manipuladas”.
“As reportagens alardearam a contaminação da água por pesticidas divulgando conjuntamente resultados de amostras coletadas nos pontos de captação antes e após o tratamento, sendo que o tratamento pode reduzir a presença de pesticidas. Os dados utilizados nas reportagens foram gerados durante 4 anos, de 2014 a 2017, no entanto, nos mapas e gráficos das supostas “contaminações” todos os resultados foram inseridos simultaneamente. Os resultados das análises foram comparados à União Europeia que não possui estabelecidos valores máximos por ingrediente ativo para água. A Estados Unidos determinou que o limite para qualquer contaminante químico em água é o limite de detecção da metodologia analítica de 0,01µg/l. As reportagens não fizeram análise pormenorizada da qualidade das informações inseridas no banco de dados, qualquer informação equivocada foi contabilizada como valor extrapolado”, pontua o C&T Agro.
VEREADOR BUSCA ESCLARECIMENTOS
O tema causou preocupação e reações na comunidade. Devido o impasse causado pela divulgação do levantamento, o vereador Acácio Rocha (DEM) iniciou uma mobilização atrás de dados sobre o sistema de água na cidade.
“Agora, deveremos buscar junto à Sabesp e à Vigilância Sanitária local informações sobre os testes realizados na água de Adamantina. A busca dessas informações se dará por meio de requerimentos e, após ocorrer a devolutiva, deveremos nos debruçar nos dados, ouvir especialistas e cogito até mesmo a realização de audiência pública sobre essa questão, para que a comunidade possa falar e também ser informada. E no que couber, seja a qual órgão for, iremos buscar os meios para tranquilizar a população – caso a situação seja de normalidade – ou cobrar providências, no caso de eventual irregularidade ou deficiência”, informou o parlamentar, ao IMPACTO.