Em meio à pandemia do novo coronavírus, a Câmara de Adamantina fiscaliza os gastos do poder público municipal em ações de combate e prevenção. Diversos pedidos de informações já foram encaminhados à Prefeitura, que decretou calamidade pública em 9 de abril.
A determinação calamidade pública, já enviada à Assembleia Legislativa para atender o artigo 65 da Lei de Responsabilidade Fiscal, significa o fim da exigência, enquanto vigorar o Decreto Municipal nº 6.133, da realização de licitação para compras específicas de materiais, insumos e serviços referentes a Covid-19.
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Além de agilizar o processo de aquisição de itens essenciais para o atual momento, o reconhecimento de calamidade pública permite que o Executivo gaste mais do que o previsto e desobedeça às metas fiscais para custear ações de combate à pandemia.
O presidente da Câmara Eder Ruete (DEM) disse que a Câmara cumprirá seu papel na fiscalização dos gastos. “Estamos atentos e investigando compras e serviços”, afirma.
Entre os gastos questionados pelos parlamentares estão a aquisição de álcool em gel, pela Secretaria de Saúde, e a instalação de tendas em frente a Caixa Econômica Federal. Pedidos de informações já foram encaminhados à Administração Municipal.
Para aquisição de 2.040 frascos de álcool em gel, o Município gastou cerca de R$ 28 mil, com custo de R$ 14/unidade, em uma empresa de Anápolis (GO). O IMPACTO teve acesso a três orçamentos dos vereadores, sendo que dois com especificações técnicas e de marca similares aos adquiridos pela Prefeitura com valores de R$ 9,49 e R$ 10,50, e outro, com as mesmas características na formulação, mas marca diferente, o custo seria de R$ 7,00 (acima de 1 mil unidades).
Ao jornal Folha Regional o secretário de Saúde da cidade, Gustavo Rufino, explicou a compra, ressaltando que “não é perfil desta Administração fazer aquisições com superfaturamento”. “Em quatro anos de gestão nunca fizemos isso, nunca fomos alvos disso. E não será agora, no enfrentamento a pandemia, que faltaremos com respeito aos nossos munícipes”.
Ele disse ainda que são “situações infundadas que estão colocando de forma equivocada na mídia” e que todas preocupações para aquisição foram tomadas, de acordo com as legislações vigentes.
“Tenho como obrigação proporcionar as melhores condições de trabalho aos funcionários, para atender melhor a população. Estávamos com estoque muito baixo deste produto, há 20 dias, quando realizamos a aquisição. Fizemos as cotações, fomos atrás, e existem situações dentro da Secretaria que não tenho 20, 40 dias, uma semana para resolver. Tenho que resolver isso de imediato, não posso deixar de faltar um EPI [Equipamento de Proteção Individual] deste para os meus funcionários. Caso acabasse, os servidores não poderiam estar trabalhando, automaticamente, a população não seria atendida […]. Não que a urgência para aquisição deste material fizesse pagar mais caro. Se pegar a descrição do produto e fazer uma cotação de preço, todos os similares estão mais caros em Adamantina”, afirmou, na entrevista.
Já para colocação das tendas a Administração Municipal gastou pouco mais de R$ 14 mil, com empresa de Osvaldo Cruz.
As informações solicitadas à Prefeitura foram feitas a partir de Ofício Especial, da presidência da Câmara, e por meio de requerimentos dos vereadores Alcio Ikeda e Acácio Rocha (Podemos).
VEREADOR RECLAMA DE FALTA DE ACESSO À INFORMAÇÕES
Um dos questionamentos dos vereadores nesta busca por esclarecimentos é a falta de acesso aos documentos. Alcio Ikeda explica que as dificuldades se concentram nas últimas semanas, com negações aos processos de compras.
“O secretário de Finanças [João Lopes] nunca foi simpático ao nosso acesso aos documentos, mas, no começo, não tive problemas e conseguia fazer a vista de processos de licitação e de despesas da Prefeitura, as vezes com alguma resistência, porém, conseguia. As dificuldades e obstruções se consolidaram neste período”, explica. O vereador Acácio Rocha também reclama da situação.
Alcio Ikeda destaca a Lei de Acesso a Informação, que determina que todo órgão público deve autorizar ou conceder o acesso imediato a qualquer cidadão. “Mesmo com a legislação garantindo o acesso imediato de documentos disponíveis a qualquer cidadão e mesmo com a Lei Orgânica garantindo aos vereadores a função de fiscalização dos atos do Executivo, a alegação da Secretaria é de que devemos apresentar requerimentos para somente depois de vários dias termos acesso aos documentos. Não imagino qual seja o motivo, também gostaria de saber”, diz.
Segundo o parlamentar, o objetivo principal não é encontrar irregularidades, mas, sim, “apurar e verificar situações” questionadas pelos munícipes. “Se pudéssemos analisar e verificar que a despesa foi feita devidamente e com razoabilidade, a nossa resposta seria de que o procedimento foi regular, auxiliando a própria Administração nos esclarecimentos à população. O aluguel das tendas e da compra do álcool em gel, por exemplo, foram casos em que a população nos procurou como vereadores para apurar as compras realizadas, e em ambos os casos fomos impedidos de realizar vistas dos processos de compras que já eram públicos”.
Alcio Ikeda também questiona o discurso de transparência da atual Administração. “Uma gestão que se diz transparente não traz obstáculos ao papel de Fiscalização de nenhum órgão ou poder. Se está tudo certo, porque dificultar o trabalho do Legislativo e burocratizar exigindo a apresentação de requerimentos?”.
Ainda, segundo o vereador, “está na moda” relacionar os questionamentos com objetivos “políticos” ou para “atrapalhar a gestão”. “Mas o que devemos entender é que a própria população pede por esclarecimentos em diversas situações, e que se existem poderes constituídos (Legislativo, Executivo e Judiciário) eles devem funcionar e suas funções devem ser respeitadas. Quando fiscalizamos gastos públicos, não estamos fazendo nada mais do que nossa obrigação enquanto vereadores, em respeito a população que paga impostos!”.
DENÚNCIAS PODEM SER APRESENTADAS AO MP
O presidente da Câmara disse ao IMPACTO que caso sejam apuradas irregularidades nos gastos os casos serão encaminhados ao Ministério Público para averiguação. “Sabemos que a situação requer ações rápidas da Prefeitura, mas isso não pode significar irresponsabilidade nos gastos. Estaremos atentos”, garante Eder Ruete.
Alcio Ikeda também pretende apresentar denúncia caso as dificuldades de acesso aos documentos permaneçam. “Já apresentei requerimento à Prefeitura questionando as condutas. Caso permaneça a ideia de que vereador não tem direito a ter acesso imediato a documentos públicos e que deve pedir tudo por escrito, vou recorrer ao Ministério Público, solicitando uma recomendação diferente aos agentes políticos frente às pastas”, conclui.
COMPRAS SÃO REALIZADAS FORA DA CIDADE
As ponderações dos parlamentares vão além dos valores das compras, mas, também, por não terem sido realizadas em Adamantina. O álcool em gel foi comprado em Anápolis (GO) e as tendas alugadas de empresa de Osvaldo Cruz.