*Eduardo Fonseca é jornalista, educador e advogado
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O campeão do mundo do futebol era o Brasil. E a sétima edição da Copa, em 1962 seria no Chile que venceu a Argentina, sua adversária na disputa da sede. E o país andino, que tinha na organização um brasileiro naturalizado chileno, Carlos Ditiboin cuidava da infraestrutura quando foi sacudido por uma desgraça natural.
Era maio de 1960 e o Brasil passava por um terremoto político pois ao mesmo tempo em que o presidente da República, Juscelino Kubitschek (PSD), inaugurava Brasília, o pais sairia dividido das eleições gerais: elege como presidente o conservador Jânio Quadros, apoiado pela UDN, e como vice-presidente João Goulart, do PTB, apoiado pela esquerda trabalhista. A divisão provocaria a renuncia de Janio, a posse de Jango e a revolução militar. No pais vizinho, como dizíamos, os preparativos iam de vento em popa,quando acontece o sismo de Valdivia, terremoto que registrou 9,5 pontos na escala Ri, o maior registrado na história mundial. O tremor tinha deixado cinco mil mortos e 25% da população desabrigada, além de lançar dúvidas sobre a capacidade do Chile de sediar a Copa depois da tragédia.
Em face desses problemas, Dittborn pronunciou a frase que acabaria se tornando o slogan não oficial da competição: “Porque nada tenenos, lo haremos todo” (porque nada temos, faremos tudo). A FIFA lhe deu um voto de confiança e as obras foram terminadas em tempo recorde.
Dittborn, porém, não viveu para ver o resultado de seus esforços. Ele sofreria um ataque cardíaco um mês antes da Copa.
A guerra fria no futebol.
Em 1962 já no auge da guerra fria e com investimentos maciços dos países da cortina de ferro no esporte, o que se viu, na verdade, nos gramados chilenos, foi a disputa entre os sul-americanos que afinal jogavam no seu continente e os selecionados do leste europeu URSS, Hungria, Tchecoslováquia e Iugoslávia, países que, sob o novo modelo geopolítico, à exceção da Hungria, não existem mais. Naquela época do pós-guerra essas nações venceram todos os torneios olímpicos de futebol. Os jogadores dessas nações, ainda amadores, não tiveram dificuldades de passar para as quartas de final da copa chilena e dois deles, tchecos e iugoslavos fizeram uma das semifinais do torneio. Já a URSS caiu diante dos donos da casa por 2×1 na batalha de Arica.
O Brasil contava com a brande maioria dos jogadores campeões mundiais na Suécia agora não mais treinados por Vicente Feola e não mais capitaneados por Bellini. Aymore Moreira era o técnico e Mauro Ramos de Oliveira era o capitão. Mas no comando continuava o marechal da vitória, Paulo Machado de Carvalho. E não éramos mais via latas. A imprensa esportiva mundial considerava o Brasil o grande favorito e, apesar de alguns contratempos não decepcionamos. O primeiro deles foi a grave contusão muscular de Pelé logo no segundo jogo, que o tirou do resto da Copa.
A conversa com o Rei
Quando estivemos juntos, em sua casa no Guarujá, Pelé e eu lembramos do episodio que assustou o Brasil naquela tarde de 2 de junho mas que patenteou sua majestade nos campos de futebol, Depois de sofrer uma forte distensão muscular , Pelé foi fazer número na ponta esquerda pois não havia substituição até então. De repente a bola caprichosa foi parar nos seus pés, Quando o capitão tcheco, Josef Masopust, que estava na marcação vê a cena, a bola nos pés do rei machucado, respeitosamente, põe seus dois braços pra trás, espera que Pelé toque na bola pra reiniciar sua função.
Surgem Amarildo e Mané. Para alegria do futebol
Com Pelé, que havia feito, na estreia, um gol de placa contra o México, fora de jogo surgem Amarildo, um avante botafoguense de incrível precisão nos arremates e cabeçadas virando dois jogos: o da Espanha, na fase preliminar quando fez dois gols e, o da final contra os mesmos tchecos e Mané Garrincha, a alegria do povo e, na época, de Elza Soares convidada de honra para assistir a Copa. Garrincha decidiu todos os jogos das oitavas de final pra frente. Fez gols de cabeça, de falta, de pé esquerdo e foi até expulso. Fez o que nunca havia feito antes, além de tudo que já fazia e assombrava o mundo do futebol. Jogou por ele e por Pelé. Foi um dos artilheiros da Copa.
E sem perder a simplicidade. Para Mané, a adversária da final, a Tchecoslováquia, era aquele time com a camisa do São Cristóvão.
Inverno brasileiro e a seleção retorna aos braços do nosso povo agora livre do complexo e orgulhoso do bicampeonato. Seríamos a partir daí e para sempre, quer queiramos ou não, o país do futebol.